domingo, 27 de setembro de 2009

COMENTÁRIOS PRECIOSOS








Querido Rogel
Realmente, a maioria dos amigos de outrora, mudaram muito, e às vezer, radicalmente
Mas existem aquelas amizades que ainda resistem a todas as mudanças
A idade avançada, também traz sabedoria.
A sabedoria de compreender as pessoas e as coisas como elas são
Diferente dos jovens que estão querendo sempre mudar tudo. Sem nem ao menos perceber o que realmente está acontecendo à sua volta. Ou com eles
E com isso, eles perdem um tempo precioso
A mudança faz parte da vida. É ela que traz a renovação
Quando compreendemos isso com sabedoria, como dizem os mestres, podemos aproveitar a vida a cada momento, com o que ela nos dá
Gostei muito de ler o seu blog
Abraço
Goretti/Daien



Estimado amigo Rogel Samuel:Li, encantado, o seu comentário acerca da minha modesta tradução deum soneto em inglês de Fernando Pessoa.Como analista arguto que é da Literatura, V. tem o dom de sondar o quepaira acima da mera análise literária em si. Vai muito além e o fazpoeticamente, desentranhando da profundidade dos seres e das obras oque não suspeitávamos como simples mortais. À sua crítica chamariade crítica poética, pois ela se se realiza no domínio daliteriedade, sendo que esta última acoplada à criaçãocrítico-poética.Suas crônicas, seus textos, estão atravessados por essa finasensibilidade, melhor dizendo, suavidade, do domínio do poético, dacrítica como criação, que faz de um texto um texto outro com umsopro do lirismo brotado na naturalidade , na espontaneidade de suaescrita.Portanto, lisonjeia-me saber que o trabalhoque faço no domínioliterario tem ressonância positiva de um especialista..Estou dando continidade às traduções de poemas pessoanos, dentro domeu tempo possível.Aproveito para informá-lo de que eu tomei a liberdade de incluir oseu Novo manual de teoria literária como indicação biblliográfica nomeu pequeno volume a ser lançadobrevemente pela editora Quártica,Breve introdução ao curso de Letras: uma orientação.Cumpprimentando efusivamente, queira dispor do amigo e admirador, Cunha e Silva Filho.

sexta-feira, 18 de setembro de 2009

Carpintaria poética

Carpintaria poética

Adrino Aragão


Luiz Bacellar é, dentre os expressivos poetas amazonenses, o mais aclamado pelas elites, estudantes e populares de Manaus. Mas, ao contrário do que possa parecer, sua poesia não é tão simples, de fácil consumo. Artesão da palavra, carpinteiro do verso, Bacellar constrói cada poema com rigor formal e forte densidade temática, numa linguagem refinada, primorosa.
Como explicar o sucesso de um poeta sério como Luiz Bacellar que não faz poesia em função do mercado? Mistérios da poesia, da arte? Talvez. Quem sabe uma resposta ao mercado do livro que aí está: a boa literatura brasileira existe; há, sim, leitores para a poesia, o conto, o romance, a novela de nossos escritores.
A verdade é que são 50 anos de trabalho poético de Luiz Bacellar. Frauta de barro, seu livro de estréia, na correta afirmação do poeta e crítico literário professor Tenório Telles, “é um marco na evolução da literatura que se faz no Amazonas”.
De formação clássica e espírito de renovação estética modernista, Bacellar pôde construir, com admirável liberdade (já a partir desse livro) algo de novo na dicção lírica de sua poesia. E que haveria de se ampliar em livros posteriores. Canta o poeta em “Variações sobre um prólogo”: “Em menino achei um dia/ bem no fundo de um surrão/ um frio tubo de argila/ e fui feliz desde então; // rude e doce melodia/ quando me pus a soprá-lo/ jorrou límpida e tranqüila/ como água por um gargalo. // E mesmo que toda a gente/ fique rindo, duvidando/ destas estórias que narro, // não me importo: vou contente/ toscamente improvisando/ na minha frauta de barro.// É o tema recomeçado/ na minha vária canção.”
Enquanto muitos destroem o passado com a ânsia de criar o novo, o moderno, o poeta Luiz Bacellar mantém forte diálogo com a tradição, elege a memória como tema em muitos de seus textos poéticos. Sem saudosismos. O passado tem o sentido de memória, de registro - seja de denúncia ou crítica (quase sempre bem-humorada) contra o silêncio do descaso, do abandono, da “insanidade de um presente” que flagela e aniquila as fontes de nossa história. Como nos versos de “Balada da rua da Conceição”: “Vão derrubar vinte casas/ na rua da Conceição./ Vão derrubar as mangueiras/ e as fachadas de azulejo/ da rua da Conceição./ (Onde irão morar os ratos/ de ventre gordo e pelado?/ e a saparia canora da rua da Conceição?” O poeta, por vezes, estende o olhar sobre gentes humildes, os esquecidos, como em “Lavadeiras”, poema do mais fino lirismo, comparável a de um Jorge de Lima: “A roupa nos varais panda flutuando,/ com seus laivos de anil coando a brisa,/ até parece ávida nau cortando/ o mar azul que a leve espuma frisa.// O vento timoneiro vai guiando/ e o sol nas bolhas de sabão se irisa/ enquanto as lavadeiras vão cantando/ a torcer e a bater na tábua lisa”. Aliás, como um Midas, Bacellar consegue transformar em filigranas de poesia as coisas mais comuns, por exemplo, um simples isqueiro, vejam: “Se, na pedra, acordo estrelas/ com um golpe do polegar,/ a chama, só para vê-las,/ já se levanta a bailar”.

Frauta de barro tem ainda outro mérito. Deu ao poeta Luiz Bacellar o prêmio Olavo Bilac, da Prefeitura Municipal do Rio de Janeiro (1959). Na comissão julgadora do concurso estavam dois dos maiores poetas brasileiros, Carlos Drummond de Andrade e Manuel Bandeira. Pode haver reconhecimento maior que este, para qualquer escritor?

Mas Luiz Bacellar não é poeta de um livro só. Outros foram publicados. Cada um deles revela, de modo surpreendente, a performance desse poeta que tece poesia de altíssima qualidade.

Sol de feira é outro grande momento literário de Luiz Bacellar. Para início, o tema é originalíssimo, senão inusitado, na poética brasileira. Professor Ernesto Renan Freitas Pinto considerou o livro um “pomar real” que “nos ensina a admirar e saborear a rica coleção dos frutos da terra”. Vejo-o como telas do mais belo impressionismo. Mas, às vezes, parece escorrer, do rondel de cada fruta, um sumo mágico de canções: é quando me sinto arrebatado pelos acordes de uma sinfonia de Bach ou Handel. Por que não de Villa-Lobos? Como nos versos de “rondel da pitanga”: “Gracioso arbusto/ de folhas breves/ todo adornado/ de frutos leves/ como as caboclas/ do meu torrão/ e as notas loucas/ do meu violão// rubras miçangas/ rubis talhados/ de viva cor/ sois vós pitangas/ cristalizados/ beijos de amor”.

Há mais, muito mais. Por exemplo, um belíssimo poema musical longo, dividido em 33 partes – ou, como declara o poeta, sonata em si bemol menor para flauta, fagote, clarinete e oboé. Inclusive uma boa safra de haicais, em que o poeta reafirma o seu talento criativo. “Rajadas de chuva/ sobre o teto de alumínio:/ sons da lua cheia.” “Como um prisioneiro/ a lua me espia pelas/ grades do banheiro.” “Água resmungona.../ No tanque limoso/ o pulo da rã.” (Bashô)

A editora Valer publicou (1998) as obras de Luiz Bacellar, reunidas em um só volume, com o título de Quarteto.

Vale a pena ler Luiz Bacellar. E conhecer, através de seus poemas, a trajetória luminosa do poeta amazonense, que atingiu o estado de excelência na poesia brasileira. Mais que isto. Ultrapassou a barreira do preestabelecido: ao lidar com elementos tradicionais, aprofunda o exato conceito de modernidade.